de tarde demais…

por este altura nos anos 80, quando eu frequentava o secundário, invariavelmente as notas baixavam no segundo período.

a coisa aterrorizava-me e eu fazia promessas a vários deuses e tinha sonhos reconfortantes com inundações, bombas e incêndios que destruiam rapidamente e sem qualquer risco para os funcionários, o edificio a que nós chamávamos sede. E por entre as chamas, as vagas de água, as nuvens de fumo, despareciam para sempre as pautas com as notas do 2ºperíodo!

no Domingo ouviu-se a sirene dos bombeiros e da janela do quarto da Gui – o meu antigo quarto – viam-se labaredas altissimas e fumo negro. O edificio – agora abandonado – era consumido pelo fogo…

pensar que isto um dia me poderia ter feito feliz.

pego na Gui e levo-a até lá para ver os bombeiros em acção, e as gruas, a água a correr… era um final de dia excitante logo após a festa de aniversário, e metade da vila teve a mesma ideia e ao longo da rua agrupavam-se magotes de gente a quem eu reconhecia a cara mas não sabia o nome, com filhos pela mão a partilhar exactamente o mesmo sonho…

de “I have seen the Promised Land”…

esta noite os meninos negros na América, adormecem sabendo que o céu deixou de ser o limite quando se chega ao cimo da montanha e finalmente se vê a terra prometida.

a terra prometida não tem mel como a da Biblia; tem justiça social e uma mensagem de igualdade onde se deixa de falar em raça e se trabalha a unidade.

a terra prometida precisa de se estender pelo mundo e de o tingir e de chegar até aqui.

e nessa noite as meninas castanhas, adormecerão sabendo que o céu deixou de ser o limite quando não se acorda todos os dias a desejar que ninguem lhes note a cor.

a audácia da esperança é também isto.

it´s not just the economy, stupid

de que pequeninos nós somos…

a mãe snobada, loura apenas em determinadas zonas capilares, de manicura Francesa e ar afectado fazia os trabalhos de casa da filha de 7 anos enquanto esperava o inicio da aula de ballet.

a criança ía dando a indicação das cores que queria na decoração da página e a mãe pintava.

a certa altura diz a criança:

– pinta o cabelo do menino de castanho.

– qual menino? este chinoca? – pergunta a mãe

– o que é um chinoca?

– é um chinês, é o que nós chamamos aos chineses. chinocas!

e monhés aos indianos, minha senhora?

e macacos aos pretos?

e porque fiquei eu calada?

de growing pains…

agora que está na escola, e que por lá ficará por mais 12 anos – até ser dada como crescida e eu cheia de orgulho a ir fotografar a cair de bêbeda num cortejo académico – agora, vive-se de coração nas mãos.

Ou melhor, eu vivo de coração nas mãos. Numa aflição tremenda tipica de quem faz isto pela primeira vez e quer equilibrar o deixar crescer e encontrar caminho, com o interferir porque a caminhada é sinuosa.

Hoje, cheguei brilhantemente, sozinha, por volta das 6 da manhã, à conclusão de que será preferivel ralhar à minha filha por andar a dar porrada nos outros, do que consolá-la por ter levado ela porrada. Porque agora já não são os empurrõezinhos do infantário. É murro e pontapé.

No caso dela, pontapé em grupo.

agora que está na escola, é muito pouco interessante observar a teia de solidariedade que surje já em rascunho entre os meninos, a temperamentalidade e fluidez das relações entre as meninas e a forma como este micro-cosmo representa tão precocemente um mundo para o qual – aos 6 anos de idade – eles ainda não se deveriam estar a preparar.

a fazer…

 

o impacto positivo dos programas de micro-credito, especialmente envolvendo mulheres, foi reconhecido há imenso tempo pelas ONG(I) e confirmado através da atribuição do prémio Nobel da Paz a Muhammad Yunus. A paz hoje em dia, já não é definida pela ausência de guerra, mas pela presença de justiça social.

A justiça social nasce quando o cidadão tem acesso a processos que lhe permitam viver a sua vida com dignidade; o acesso à educação, à informação, à saude, a um ambiente despoluido, à definição livre da sua orientação sexual, à pratica religiosa…

Mas acima de tudo, a justiça social nasce quando é permitido ao cidadão sustentar e sustentar-se, e a dignidade que daí advém promove a necessidade de tudo o resto.

O micro-credito tem permitido a muitas familias criarem o seu próprio sustento. Uma familia com um rendimento base fixo, manda os seus filhos à escola e inicia um processo de efeito de bola de neve com resultados surpreendentes.

As melhores beneficiárias do micro-credito são as mulheres. Mais de 90% das clientes do Banco de Yunus no Bangladesh são mulheres. As mulheres assumem com mais facilidade e consciencia os principios do micro-credito. Como há muito muito tempo a UNICEF descobriu, educando um homem educa-se um individuo – educando uma mulher educa-se uma familia.

A sustentabilidade é uma das maiores lutas de quem trabalha em Desenvolvimento. Principalmente Desenvolvimento Comunitário. A ajuda cria dependência e quando quem ajuda se retira as comunidades voltam ao ponto de partida sem capacidade para dar continuidade ao iniciado.

A permissa do provérbio Chinês de não dar peixe mas ensinar a pescar continua válida, mas o micro-credito introduziu-lhe uma nova variante; criam-se condições para que a pessoa compre a sua própria cana e defina quanto peixe vai pescar – e com um apoio extra – em que mercado o vai vender.

Através da Joana (obrigada!) descobri a Kiva.

A KIVA, é uma organização que permite ao cidadão comum participar e incentivar este processo de desenvolvimento com o seu próprio dinheiro, recebendo-o de volta ao fim de 6 a 12 meses, podendo depois optar por re-emprestá-lo ou retirá-lo.

O site possui uma listagem de projectos e pessoas e é-nos permitido seleccionar aquele que vamos apoiar e a quantia que queremos dispender.

E assim, com um click e meia duzia de euros, mudam-se vidas… 🙂