Tenho com Timor uma relação diferente da maioria das pessoas que conheço por duas razões; essa e a outra.
– A outra porque dediquei grande parte do tempo em que deveria estar a decorar teorias de Durkheim, refinar o discurso académico e justificar o dinheiro investido no ensino privado, a trabalhar a nivel nacional e internacional, a questão da autodeterminação através do Movimento Associativo. Muitos anos antes da coisa realmente acontecer.
– Essa, porque tenho uma filha Timorense, que herdou uma história de luta vivida por cada uma das mulheres da familia dela, que lutaram e morreram ao lado dos homens.
Amo Timor como se ama um filho travesso.
À minha filha ensinei a dizer que sente orgulho por ser Timorense. Ensinei-lhe o 12 de Novembro, versões ingénuas dos conflitos dos ultimos 2 anos, a reconhecer o cheiro da terra molhada depois das primeiras chuvas, do café ainda em planta, da canela raspada da árvore. A temer corcodilos e tubarões na água, a gritar quando vê um escorpião, trincar amendoim caramelizado e sate de coração de búfalo… e tudo isto para que ela crie uma dupla identidade em que não haja lugar há supremacia de uma cultura sobre a outra, dentro dos limites do possivel, do razoavel e do viável; moldado pelas minhas próprias limitações…
Recusei empregos que me providenciariam dinheiro que me faz muita falta, por ter consciência de que um dia quando ela crescer, terei que lhe justificar cada um dos meus envolvimentos profissionais como afirmações de carácter politico. E sei que não teria forma de encontrar justificações válidas.
Hoje o M telefona-me a chamar-me a atenção para o artigo do Pedro Rosa Mendes no Público. E lêmo-lo em conjunto ao telefone.”Timor-Leste; a ilha insustentável”.
Não conheço o Pedro Rosa Mendes, nunca convivi com ele em Timor, nunca o vi sequer e não tenho qualquer referência sobre a razão que o terá levado a escrever um artigo daquele género. No final fica a sensação de que nada do que diz é novo e tudo o que escreve o é. A novidade do artigo reside na ortografia do discurso. E é como se cada conversa no bar do hotel tivesse sido passada á escrita. E isso traz consigo a tristeza enorme que advém do fim de um estado de negação, e da consequente perda da inocência. E eu fico sem saber decidir se o acho corajoso, destemido ou simplesmente inconsequente.
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