de memória…

Quando via as imagens do massacre de santa cruz nunca imaginei que um dia passaria por lá diariamente queixando-me do trânsito.

Por vezes o tempo relativiza o drama e esvazia as coisas da sua memória

Santa Cruz é um atalho para quem quer chegar a Bemori sem a atrapalhação do trânsito de Audian

Uma vez por ano Santa Cruz recupera o seu estatuto de simbolo de resistência e opressão.

Uma vez por ano não há alternativa ao trânsito de Audian.

de Dame…

côco naufrago

côco naufrago

quando em 99 nos colávamos à televisão a seguir atentamente um Timor que víamos em directo pela primeira vez, não adivinhávamos o horror que se seguiria.

o rapaz cuja imagem foi repetida à exaustão mostrando-o morto numa mancha enorme de sangue na rua,  descubro 2 anos mais tarde ser o irmão mais novo da mulher que se tornaria uma das minhas mais próximas amigas. e esta semana pude juntar-me à familia e amigos e celebrar a vida dele – falhei a missa porque entrei na igreja errada e assisti ao funeral da avó de alguém que ainda hoje – no sítio onde estiver –  estará por certo muito confusa com a minha presença.

10 anos depois os amigos juntaram-se como se se tivessem encontrado na noite anterior, como se nada tivesse mudado e o tempo não os tivesse transformado em gente diferente. 10 anos depois os mesmos amigos que saltaram os muros do cemitério para o ajudar a enterrar e que desapareceram no mesmo silêncio com que chegaram por entre distracções de militares, espalharam flores, acenderam velas e sorriram e conversaram como se fossem novamente adolescentes e como se nada daquilo lhes tivesse verdadeiramente acontecido.

a todos e a cada um foi-lhes retirada a infância. e a todos e cada um dos filhos deles, 2006 reavivou o mesmo ciclo. e o sofrimento torna-se uma coisa tão real, e o medo tão estranhamente familiar que se transforma numa aparente indiferença disfarçada de aceitação.

No discurso dos 10 anos, Ian Martin menciona o conhecido milagre da mesa eleitoral 22.

Na mesa eleitoral 22 apareceu em braços uma velha que tinha morrido no dia anterior. A familia deitou-a, vestiu-a, rodeou-a de velas e velou-a durante a noite. Pela manhã ela desperta e informa-os que tem que ir votar. E foi.

os 10 anos pós referendo são 10 anos de história que se diz imperfeita. Como se houvesse um padrão de qualidade para a história.

os 10 anos de pós referendo são 10 anos de aprendizagem. Nada mais.

com os altos e baixos inerentes à descoberta da democracia num sítio onde o conceito é não só novo como antropologicamente estranho.

os 1o anos de referendo serão 10 anos de história imperfeita para os que acreditam que têm o direito de interferir, para os que acreditam que possuem os modelos perfeitos , a solução ideal, o único caminho viável. A aprendizagem faz-se lamentavelmente através do erro, com a queda, com a decepção. E o caminho vai-se encontrando retirando humildade da experiência.

Timor é a tua primeira terra, minha filha. Está marcado na tua pele, no formato dos teus olhos, na tua obstinação, nas curvinhas do teu corpo em crescimento. E um dia vais aprender sobre as mulheres da tua familia de origem; sobre a forma como viveram, como lutaram, como morreram a resistir. E vais sentir Timor no peito e lembrar o cheiro da terra molhada e aprender a glória da luta, e a dor de resistir e se tudo correr bem, vais sentir orgulho e pertença e fluir entre este mundo daqui e outro para onde te levei e encontrar paz em tudo isso.

Dame!

de por vezes…

DSC00712

Por vezes penso que gostaria de crescer e deixar de me sentir confusa. De saber exactamente o que quero. Ter um percurso definido, objectivos demarcados e acima de tudo certezas absolutas. Gostava de ser uma dessas chatas com certezas absolutas. Daquelas que começam frases com”eu sempre disse que…”

Mas é o não querer isto hoje e o sentir que não posso viver sem isso amanhã, é nessa incerteza nesse não saber, no querer não querendo, no tendo sem procurar, no procurar não encontrando e no estado de fragilidade que a constatação de tudo isso provoca, que reside a essência daquilo que sou.

E se por vezes penso que gostaria de crescer e deixar de me sentir confusa. De saber exactamente o que quero. Ter um percurso definido, objectivos demarcados e acima de tudo certezas absolutas, rapidamente chego à conclusão de que cresço com cada dúvida que enfrento, que me defino pelo rasto que vou deixando e que vivo com a certeza absoluta de tudo isto.

de positivo…

mornings in the backyard

Quando se acorda pela manhã de coração engelhado, quando nem Good Charlotte ajuda, nem sumo de laranja da Susana, nem torrada de cereais, nem café da montanha, nem perfume de côco, coloque a pessoa os saltos mais altos, abra a pessoa a porta e a contraporta e caminhe, com a levura permitida por uns tacões de 15cm, em direcção ao jardim.

E que a pessoa olhe o chão e  sinta a cor. Um dedo de cada vez. Uma perna. um braço, cada poro.

E continue a pessoa para o carro  manobrando-o com cuidado espreitando atraves da cor e seguindo depois ao longo do mar já com velocidade.

E sorria a pessoa ao contemplar a chuva de petalas de jambo que vai deixando para trás; contaminando a rua, os carros que passam, deixando-as soltas no ar… e na manhã seguinte acorde-se de coração engomado, coloque-se os saltos do costume, abra-se a porta e a contraporta e caminhe-se, com a levura permitida pelo seu proprio 1,61 de altura, em direcção ao jardim. E que a pessoa olhe o chão e sinta a cor. E que se sente ali já de pés descalços, 30 segundos de pausa antes do dia começar, encoste-se o tronco ao tronco, feche-se os olhos e veja-se a cor por dentro.

E saiba-se que nada pode ser mais intimo do que isto, nada pode ser mais honesto do que isto; o prazer da cor que chega com a estação; sem data mas com época. Que murcha e se extingue ao fim de uns dias e que deixa pouco mais do que uma memória fotografica.

da memoria..

O photojojo é um sistema que funciona através do flickr seleccionando fotos e enviando-as bimensalmente um ano depois.

Tem também cápsulas do tempo onde se guardam mensagens que serão enviadas no período  pré definido.

Hoje recebi 3 fotos de há um ano atrás:

A minha filha oriental com o céu de fim do dia no jardim da avó.

mae lae

A sangria de champanhe e frutos silvestres típica das festas de aniversario do irmão mais novo.

sangria

Os pés sujos adormecidos de final de dia de brincadeira descalça.

pes

E passa-se o dedo sobre o monitor e contorna-se um pezinho de cada vez…

de aniversario…

por vezes a vida trata-nos bem e apesar da distancia de seres pequeninos que nos enchem o coracao de saudade, surgem estranhos que se tornam proximos e o afecto chega de todas as formas, vindo das mais inesperadas direccoes, expresso nos mais surpreendentes e delicados gestos.

e ja muito tarde enrolada nos lencois brancos emprestados que me lembram a infancia, inicio, sem dar conta, um exercicio de revisao de todos os nomes que fizeram o dia especial. Assim um a um como quem desfia um rosario, com a diferenca de que cada conta e’ um rosto e cada rosto ‘e uma memoria e cada memoria um gesto e cada gesto …

e antes de terminar o raciocinio, assim mesmo mesmo antes de terminar o exercicio adormeco profundamente num muito provavel ritmado ronco qualificado pelo habitante do quarto ao lado de 4.2 na escala de Richter…

de Vulindlela…

dos muitos sons que associo a Timor, este sera estranhamente aquele que me transportara imediatamente para ca.

nao ha restaurante, festarola, taxi, mikrolete, barzinho da moda que nos ultimos 6 anos nao tenha a Brenda Fassie a gritar Vulindlela.

Vul’indlela wemamgobhozi
He unyana wam
Helele uyashada namhlanje
Vul’indlela wela ma ngiyabuza
Msuba nomona
Unyana wami uthathile
Bengingazi ngiyombon’umakoti
Unyana wam eh ujongile this time
Makgadi fele usenzo s’cede
Uzemshadweni ngiyashadisa namhlanje
Bebesithi unyana wam lisoka
Bebesithi angeke ashade vul’indlela
Chorus x 2 :
Vul’indlela we mamgobhozi
Vul’indlela yekela umona
Kodwa wena maNgobese
Hey unomona
Ngoba awunanyana
Unentombizodwa
Ayoyoyo mangobese
Hee unomona ngoba hee awunaye unyana onjengowami
Bengingazi ngiyombon’umakoti
Unyana wam eh ujongile this time
Makgadi fele usenzo s’cede
Uzemshadweni ngiyashadisa namhlanje
Bebesithi unyana wam lisoka
Bebesithi angeke ashade vul’indlela

6 anos depois continuamos todos sem saber o que a senhora diz…

de para a Gui #6

O Hermenegildo acorda de barriga para o ar. Que grande soneca!

No porto já começa a escurecer. O ferry partiu novamente levando outras pessoas, outras crianças, outras galinhas e outros cavalos. Os grandes navios ainda se vêem lá ao longe, e os automóveis estão agora muito alinhados à espera dos novos donos que os virão buscar. Os sacos de arroz sobem a montanha dentro de camiões e os funcionários do porto acendem os cigarros e caminham para a rua em direcção a casa.

O Porto fica silencioso e só se ouvem as ondas pequeninas a bater nas pedras. E então o Hermenegildo estica-se, estica-se a espreguiçar-se; cauda no ar, patinhas da frente dobradas e abre muito, muito a boca a bocejar.

– Meraaaaaaaaaaau! – que deve querer dizer “estou pronto para a aventura”, porque ele levantou-se com passos muito decididos a bater com força com as patas no chão, deixando as marcas em triângulo desenhadas no pó, muito direitas a apontar para a frente.

Apenas para a frente.

E chegou à outra ponta do porto, onde acaba o alcatrão e começa o mar.

E sentou-se.

Mexeu o narizinho e sentiu o cheiro forte do mar. Inspirou outra vez e mexeu as orelhas quando sentiu a brisa fresca a passar. O céu estava já coberto de estrelas e ele levantou a cabeça e olhou para elas. O mesmo movimento que fez quando olhou para a minha janela. A janela que fica entreaberta para ele poder entrar.

E pensou nisso e sentiu saudade.

Um peixinho saltou na água e ele lembrou-se do prato em tons de azul com formato de peixe no chão junto ao armário onde todos os dias ele encontra comida.

E pensou nisso e sentiu saudade.

E sentiu uma coisa por dentro, assim uma coisa desagradável, uma coisa que começou pequenina, pequenina e cresceu, cresceu até lhe chegar aos olhos e ao coração e se transformar em lágrimas. Essa coisa chama-se tristeza. A tristeza é uma coisa que aparece sem ser convidada e esconde-se dentro de nós. Depois quando quer sair transforma-se em lágrimas e rola pela cara abaixo. Rola, rola até chegar ao queixo. E se estivermos a escrever a tristeza pode cair em gotas em cima dos nossos desenhos e se a provarmos descobrimos que é salgada.

E ás vezes quando sentimos saudade sentimos tristeza. Mas a saudade do Hermenegildo não tinha tristeza.

Era uma saudade feliz.

Porque o prato em tons de azul com forma de peixe estará sempre no mesmo sítio ao lado do armário à espera dele.

Porque a janela do meu quarto estará sempre entreaberta à espera dele.

Porque o gato cinzento e o gato das manchas e o gato laranja com a pata branca e o outro gato irritante que mia de maneira esquisita estarão todas as noites no mesmo telhado e todas as tardes no mesmo muro e todas as manhãs nas casas dos donos deles. Porque há coisas no nosso mundo que nunca mudam e serão sempre sempre iguais.

Assim como a Margarida e a Ana rosa e a Carolina estarão sempre aí; no ballet, no piano, no recreio da escola. E se ficares podes vê-las todos os dias, mas nunca verás este porto onde chegam navios com automóveis na barriga, nunca verás o ferry que transporta pessoas, crianças, galinhas e cavalos, nunca sentirás este cheiro do mar no nariz, nem a baleia atrasada nem o céu laranja. E até os gatos percebem que o mundo é uma coisa grande. Grande, grande com línguas diferentes que é bom aprender, com meninas diferentes com quem é bom brincar.

E por isso o Hermenegildo fez:

-Miaudau! – que nós já sabemos que quer dizer “Nada me assusta”, e levantou novamente a cabeça para o ceú e agitou o nariz e sacudiu as orelhas e descobriu ao longe um barquinho de pesca parado na areia. E correu nessa direccão com passos muito decididos a bater com força com as patas no chão, deixando as marcas em triângulo desenhadas na areia, muito direitas a apontar para a frente.

Apenas para a frente.

Saltou para o barco e escondeu-se debaixo das redes de pesca.

– Miaudau! – “Nada me assusta”!

E a aventura está prestes a começar!

Miaudau, nada me assusta!

E agora diz tu baixinho:

– Miaudau, nada me assusta!

E agora devagar:

– Mi-au-dau, na-da me a-ssus-ta!

E agora a sussurrar:

– Miaudau nada me assusta!

Boa noite, minha Gui!

Miaudau, que nada te assuste.

Miaudau…

de para a Gui #5

Cansado da sala, dos quartos, do jardim e da pequena praia, cansado de viver num mundo tão pequeno, o Hermenegildo acorda determinado a mudar de vida.

Corre para a cozinha, toma o pequeno almoço na sua taça em forma de peixe em tons de azul e encaminha-se para o portão.

Olha para a direita e vê os meninos a brincar na rua. Olha para a esquerda e vê a estrada grande. Olha para trás e vê a casa com a varanda onde todos se sentam a beber café e contemplar o mar, e a porta da cozinha onde junto ao armário se encontra a taça em forma de peixe em tons de azul. Levanta mais a cabeça e olha para o meu quarto lá no cimo, com a janela entreaberta para que ele possa levantá-la com a pata e entrar durante a noite. E o Hermenegildo respira fundo e diz:

– Miau! – assim, apenas um simples “Miau” maldisposto que em língua de gato deve querer dizer “Adeus”, porque ele partiu estrada fora muito senhor dos seus bigodes, a bater com força com as patas no chão, deixando as marcas em triângulo desenhadas no pó, muito direitas a apontar para a frente. Apenas para a frente.

E desapareceu.

Caminhou durante duas horas ao longo do mar. Ao lado passam carros em alta velocidade, taxis amarelos, bicicletas verdes, motorizadas com muitas cores. E todos apitam, fazem pó e fumo, gritam uns com os outros.

– Miaudau! – Fez ele, que deve querer dizer “Nada me vai assustar”, porque ele continuou de passo certo deixando as mesmas marcas em triângulo desenhadas no pó, muito direitas a apontar para a frente. Apenas para a frente.

E caminhou mais uma hora. Passou em frente ao farol e sentou-se a descansar. Olhou para o mar e viu um atum a saltar e pensou:

– Miauuurau! – que deve querer dizer “Tenho fome” porque ouviu-se a barriga a reclamar. Mas como é um gato valente levanta-se e continua a viagem. E caminhou, caminhou, caminhou até que chegou ao porto.

E escondeu-se.

No porto há uma grande agitação; barcos carregados de sacos de arroz chegam. Pequenas filas de gente levam os sacos até um grande camião. Navios enormes abrem as portas e de dentro saem automóveis. O Ferry despeja pessoas e sacos e crianças e galinhas e cabras e dois cavalos que viajaram da ilha até aqui. E entre eles estão homens de Ataúro carregados com esculturas de madeira negras para vender aos Malae em Dili.

E o Hermenegildo esconde-se. Esconde-se bem escondido debaixo das folhas de uma bananeira baixinha. (As bananeiras não são árvores. As bananeiras são ervas gigantes, mas pouca gente sabe disso.)

– Miauraurau! – disse ele, que deve querer dizer “vou esperar”, porque ele deixou-se ficar ali muito quieto, mesmo muito quieto, tão quieto, tão quieto, que acabou por adormecer…

de para a Gui#4

Existem três formas de um gato se alimentar, pensou o Hermenegildo.

3!

Primeira forma: um gato pode esconder-se durante horas assim debaixo de uma mesa, ou debaixo de uma cadeira, ou mesmo dentro de um armário caso alguém se esqueça de o fechar. Espera, espera, e quando aparece um daqueles ratos tontos que pensa que por ser pequeno ninguém o vê, salta e come-o.

Possível problema, o rato é rápido e foge. O gato então tem que o perseguir e isso é uma coisa muito cansativa.

Segunda forma: um gato esconde-se atrás de uma cortina ou atrás de uma bota alta de borracha que não esteja muito suja e espera que um outro gato que esteja há horas escondido debaixo de uma mesa, ou debaixo de uma cadeira, ou mesmo dentro de um armário que alguém se tenha esquecido de fechar, salte e apanhe um daqueles ratos tontos que pensa que por ser pequeno ninguém o vê. Quando o outro gato estiver quase quase a comê-lo, assim mesmo com a boca aberta aberta e os olhos um bocadinho fechados por a boca estar tão aberta , então nesse momento o gato salta e rouba-lhe o rato.

Possível problema, o outro gato é rápido e foge. O gato tem que o perseguir e isso é uma coisa muito cansativa.

Terceira forma: um gato faz um ar amoroso e roça-se nas pernas da sua dona, ela pega-lhe ao colo e ele começa a fazer rom-rom. A dona, absolutamente encantada corre a abrir uma latinha especial de patê de sardinha.

Possível problema: a dona constata que o gato lhe encheu de pêlos o vestido comprido dourado com borboletas pretas em veludo e coroa a condizer. Fica furiosa porque estava mesmo mesmo para sair e torna-se um bocadinho agressiva. O gato tem que fugir e isso é uma coisa muito cansativa.

Mas existe uma quarta forma que só o Hermenegildo conhece: um gato senta-se em cima do frigorifico onde estão sentados alguns bonecos um pouco estranhos, e fica muito quieto. Mas mesmo muito muito quieto. Tão quieto que ninguém percebe que ele respira, que ele mexe os olhos, que ele abana as orelhas ou sacode os bigodes. Quieto como se fosse apenas mais um boneco! E espera porque sabe que alguém terá fome. Alguém muito distraído virá cozinhar. Alguém irá virar as costas por um momento, ou esquecer-se de qualquer coisa no quarto e ir lá a correr buscá-la. E nessa altura um gato esperto salta de cima do frigorifico, lança-se sobre o prato, escolhe o mais saboroso dos pedacinhos de carne e foge silenciosamente para o jardim…

E agora que expliquei as 3 formas possíveis de um gato se alimentar e a forma mais simples de um gato o conseguir fazer, vou voltar para a cozinha porque o meu lanchinho está a arrefecer.

– Oh! Onde está o meu crepe? Hermenegiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiildo!

de mar nos pes…

Sexta.

Os táxis não circulam para a zona do escritório. Limpam-se as ruas e corta-se o trânsito.

O taxista transporta-me durante 200m. Pára e avisa-me que não pode continuar. Cobra-me. Recuso-me. Cobra-me. Recuso-me. Cobra-me. Saio e vou embora.

Sento-me no muro em frente à Lusa e recordo os “Sampaios”.

Nota mental. Boa gente. Saudades.

Reorganizo-me; mensagens aos colegas do escritório. Espero.

Mensagem à M. 21minutos e meio diz a resposta. De atraso, penso eu. E sorrio!

Espero. Sentada no muro à beira da estrada.

Apago mensagens antigas.

Espero.

Fotografo a Lusa.

Espero.

Entedio-me e espero.

O vento traz-me o cheiro do mar. Viro-me. 60 graus apenas. Viro-me.

E atrás de mim uma imensidão de calma azul. Ondas pequeninas que se desfazem muito delicadamente na areia escura. Pedaços de coral que rebolam delicadamente na areia escura. Um mar que parece não querer incomodar.

Viro-me. Mais 30 graus apenas. E passo as pernas para o outro lado e piso a areia.

Inspiro.

Espero. Mas é um outro esperar.

E caminho até à água e deixo o mar entrar-me nos sapatos.

Expiro.

Espero. Mas é um ainda outro esperar.

E volto-me e regresso ao muro com o mar atrás das costas. Sabendo-o lá. Sentindo-o lá.

E a M chega de sorriso aberto e A. no banco de trás e eu subo sem que ninguém perceba que viajo com o mar nos pés e 90 graus de areia, iodo e coral.