Quando era miúda a minha escola estava ladeada de um campo imenso que se cobria de florzinhas amarelas e papoilas mal a Primavera rompia. E de quando em quando passávamos a hora do recreio a colhê-las e oferecê-las à professora angustiadas ao vê-las a murchar a cada segundo depois do corte.
Hoje é uma pequena urbanização com repuxo no meio e uma homenagem a Sá Carneiro.
Quando era miúda a minha escola estava ladeada de um descampado onde uma vez por ano o circo acampava, e passávamos a hora do recreio entre as jaulas dos animais, e espreitávamos a grande tenda que tinha um odor abafado de erva pisada.
Hoje há uma série de prédios, uma esteticista, dois cafés, um minimercado, uma ourivesaria, uma papelaria e uma daquelas creches em apartamento.
quando era miúda atravessava-se a estrada que passava atrás da escola e havia um charco onde cresciam peixes cabeçudos. e de quando em quando a hora do recreio era passada a tentar apanhá-los e fechá-los num frasco e levá-los para a sala de aula – a versão provinciana do peixinho dourado numa turma onde 40% dos meninos calçavam sandálias com meias em pleno Inverno, resgatadas durante a fuga das ex-colónias.
Hoje há um quartel de bombeiros, uma estação de serviço, várias cabeleireiras, ópticas e dezenas de edifícios de apartamentos.
Gosto do progresso. Gosto de ver as comunidades a evoluírem e a adquirirem condições e equipamentos técnicos e sociais. Mas gostava que fosse assim em todo o lado menos aqui.
Que os meninos fossem a pé para a escola e saltassem a vedação para apanhar flores à professora, caçassem peixes-cabeçudos a sonhar com as cores dos tropicais, e espreitassem leões do circo que chega à vila e causa rodopio. Que a escola ficasse ali no meio do verde, a servir leite quente em canecas sebentas de plástico e sandes de afiambrado no intervalo da manhã, que as quartas fossem dia de piscina, que em Março se fosse à serra plantar árvores e dizer poemas, que o 25 de Abril fosse passado no mercado a pintar a liberdade e que todos fossem vizinhos.
Queria-a assim. Sempre assim…
Percebo-te… a minha mãe diz que há 30 anos que compra o leite no mesmo sítio, mas onde antes existia uma quinta é agora o continente!
como te entendo mas, é difícil ter o melhor dos dois mundos. Mesmo assim podia fazer-se melhor.
o blog está muito bonito.
bj