
(na foto – o fantástico grelhador singer dos Staats!)
quando eu morava em Alfama numa casa fantástica junto à Igreja de Santo Estevão, daquelas em que baixamos a cabeça para passar da cozinha à sala, com fogão de lenha em ferro do seculo XVIII, com escadinhas estreitas de madeira para subir ao primeiro andar, com banquinhos de pedra nas janelas, e janelinhas pequenas nas portas.
quando eu morava em Alfama e secava a roupa no estendal à janela, quando era fotografada por 15 japoneses de cada vez que pendurava as cuecas, quando me afastavam a cortina da sala do rés do chão para me espreitarem a casa – “oh sorry”! – enquanto comia os cereais com o sol de Maio a bater-me nas pernas, quando abria a porta e deixava o cão sair para passear e a vizinha me fazia o relatório – “A sua Maria, andava ali com um cão vadio” -assim como se ela fosse menina e lhe tivesse que velar pela reputação.
quando caminhava a pé para o escritório, ali junto ao castelo, quando descia à baixa no 28 cheio de turistas e alunos de circo e advogados a querer ser juizes, quando corria ao celeiro comprar o almoço pronto e subia a pé sem me cansar.
nessa altura, fatalmente nessa altura, quando as ruas vestiam manjericos de papel e os meninos faziam os altares de cartão. quando os vizinhos compravam a sardinha e começavam a cortar a fruta para a sangria, quando finalmente estava pronta para viver os santos da parte de dentro, todos os anos, fatalmente, uma reunião era marcada em Londres e eu passava a semana fora…
e quando regressava, as ruas tinham o cheiro pestilento da festa que acabou, os papelotes presos só por uma ponta, os altares teimosamente no mesmo sítio e só uma coisa alegrava os dias: a puta da discussão sobre a puta da marcha – onde diga-se só tinham marchado putas – e a filha da putisse de terem ganho nesse ano!
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